sexta-feira, 28 de maio de 2010

Time-Out?! II

(cont.)
Certifiquei-me que a porta estava bem fechada, e de relance, observei o desnível necessário vencer para chegar ao piso térreo do prédio.
Carregava comigo dois volumes, que os teria de transportar para um terminal de onde partiriam com destino certo. Depois de pesados e etiquetados vi-os partir aos repelões e ainda mal eles tinham desaparecido já eu estava de volta à cidade, onde me esperavam aqueles que para sempre farão parte da minha familia. Com eles esperavam também os relatos de algumas vivências, algumas recordações, lembranças de momentos inesquecíveis.
Entre sorrisos e gargalhadas e alguns momentos de um silêncio nostálgico, a Natureza pronunciou-se. Aquelas nuvens, a quem ninguém tinha dado qualquer importância, resolveram esgotar-se do seu precioso tesouro. Coincidência ou não elas traduziam em pleno aquilo que eu sentia por dentro apesar de não o revelar. "C'um raio! Ok, estamos em Janeiro e não é tão raro assim chover nesta data em Cabo Verde, mas tinha que ser logo nesta noite?!"
A conversa prosseguiu, aromatizada por aquele cheiro a terra borrifada, as "noivas" e "uisquinhos" foram-se seguindo, misturados com um sentimento melancólico de saudade, terminando na inevitável "peça que leva".
A comitiva abandonou o local, discretamente, sem batedores e sem avisar à passagem. Palmarejo, Tira-Chapéu, Terra Branca, Várzea, Chã de Areia, Gamboa, Praia Negra e finalmente, o destino. Uma grande achada nos arredores da capital.
Umas luzes geometricamente perfiladas apontavam-me o caminho a seguir. A "súcia" estava-se a desfazer. Ou pelo menos prestes a perder um elemento!
O chão fazia lembrar-me as minhas origens, a minha formação, o meu trilho.
"Última chamada para o voo...!" ecoava uma voz no vestíbulo.
Tinha chegado a hora!
.......
Retirei os dois volumes da passadeira rolante, ansioso por abri-los. Queria verificar se as minhas memórias estavam lá guardadas. Ainda não sei se me vim embora, ainda não sei se cheguei, ainda não sei se isto tudo é um "time-out" ou um "game-over", veremos quais os capítulos que se seguem. Sei apenas que comigo estão as lembranças destes dois anos.
Olhei em volta, enchi os pulmões de ar e dirigi-me para a saída, pois aqui também tinha deixado alguém à minha espera!

Sodade des tera!

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Time-out?!

O dia acordou calmo na capital das terras de "morabeza"! Uma ligeira brisa corria nas ruas semi-desertas, varrendo as finas particulas vulcânicas, como de uma multidão de tratassem à passagem de uma caravana qualquer. A temperatura estava amena, como é natural nestes paralelos, propicio ao convivio num terraço de uma fortaleza, estrategicamente implantada, com uma vista previligiada, por forma a controlar e dominar as áreas em redor.
Pois assim foi! A convite de um amigo fui até à Cidadela onde, no seu oásis, nos recebeu e presenteou com uma refeição apropriada às condições deste dia.
Esgotados os recursos desse oásis, fomos direccionados instintivamente para aquele recanto da praça do Palmarejo. O objectivo era repor as energias e deleitar-nos com aquilo que o arquipélago tem de melhor: o tempo.
Anoitecia quando dei por terminada a degustação daquele momento. Algumas nuvens começavam a passar por cima de mim, sem, no entanto, lhes dar qualquer importância. Ainda tinha alguma coisa por fazer, por isso, assomei até ao terceiro andar do edificio que se erguia diante mim. Quando me preparava para colocar a chave no ferrolho da porta de entrada do meu apartamento, tudo ficou às escuras, como que eu tivesse, inadvertidamente, accionado algum tipo de alarme. Pressionei o interruptor, amaldiçoando-o de imediato, pois não tinha obtido o resultado desejado. Teria então que fazer tudo o que estava previsto ou no lusco-fusco ou às escuras.
Um par de horas depois, continuava sem electricidade, mas tinha esvaziado todos os nichos do local que durante quase um ano chamei de "casa". As cortinas esvoaçavam, amparadas pelo vento que se tinha levantado. Dirigi-me até à varanda, com vista para a rua principal, mesmo em frente à academia. Na rua ouvia-se apenas um burburinho, observei os vultos que me afrontavam tentando distingui-los, em vão, pois a noite já tinha conquistado o lugar ao dia. Foi quando estava prestes a voltar costas que alguns dos candeeiros de rua começaram timidamente a acender. Um a um, foram ficando mais intensos, por forma a dar a luminosidade que eu queria, permitindo-me, desta forma, reconhecer e contemplar a paisagem que me tinha acompanhado durante as últimas estações...(cont.)